quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A confusão de bicos: porque a mamadeira não deve ser utilizada

Compartilhando um texto muito bacana sobre confusão de bicos do site Acalmma. Este texto foi escrito pela fonoaudióloga Cristiane Gomes. Acompanhem o texto, reflitam ...


É de conhecimento geral que o aleitamento materno é a estratégia que, isoladamente, possui a capacidade de evitar morbimortalidade infantil, especialmente pelas substâncias presentes no leite que favorecem a saúde geral, pelo contato entre mãe e bebê que permitem o estabelecimento e manutenção dos vínculos afetivos, pela capacidade do leite materno promover adequado crescimento e desenvolvimento da criança, dentre muitas outras vantagens.
Também é de conhecimento geral que a mãe deve amamentar seu bebê exclusivamente por 6 meses e com alimentação complementar por 2 anos ou mais e que é desaconselhável o uso de bicos artificiais, no entanto, este último tema não tem sido esclarecido à população e o uso de bicos é uma realidade impactante nos índices de aleitamento materno em nosso país, especialmente no sul do Brasil.
É importante salientar que, em geral, as gestantes já recebem mamadeiras como presentes nos chás de bebê, “no caso de haver necessidade”. Parece um ato inocente e de apoio, porém com terrível possibilidade de favorecer o desmame precoce.
Apesar do Ministério da Saúde desaconselhar o uso de bicos artificiais e o nono passo da Iniciativa Hospital Amigo da Criança indicar que não se deve oferecer bicos artificiais a crianças amamentadas, a cultura da mamadeira está arraigada e, mesmo com as ações de proteção ao aleitamento materno, especialmente por meio da NBCAL, ainda há uma falsa sensação de que os bicos artificiais são inofensivos.
Na realidade, o uso concomitante de bicos artificiais e aleitamento materno pode causar a chamada “confusão de bicos”, termo utilizado inicialmente por Neifert, Lawrence e Seacat (1995). A partir do momento em que o bebê recebe alimentação por meio de bicos artificiais, a ação das estruturas orais se modifica de tal forma que, ao retornar ao aleitamento materno, não haja condições de realizar a ordenha da mama, visto que tais estruturas sofreram mudanças de tônus, mobilidade e função.
O que decorre dessa disfunção motora oral é uma sequência de situações que, cedo ou tarde, levarão ao desmame: bebê não se alimenta o suficiente, chora, a mãe oferece complemento, por não haver estimulo mamário para a produção de leite há uma redução de seu volume, o que se torna um ciclo vicioso que termina por favorecer a alimentação exclusiva por mamadeira.
Para explicar melhor as diferenças estruturais, de tônus muscular e de função oral apresento o quadro abaixo, que mostra as diferenças básicas entre a sucção no aleitamento materno e na mamadeira:

ALEITAMENTO MATERNO

MAMADEIRA
- o peito da mãe se conforma à boca do bebê, o que nenhum outro tipo de bico permite;a boca do bebê tem que se adaptar ao bico, o que afeta a posição da língua, lábios e céu da boca;
- a língua do bebê consegue vir para fora para pegar o leite e leva-lo ao fundo da boca para a criança engolir;- Em todos os bicos, (comum ou ortodôntico) a língua do bebê vai para trás porque é empurrada pelo bico, que é rígido, e isso muda a sucção do bebê;
- o bebê faz quatro movimentos com a mandíbula (queixo): para baixo (abertura), para frente (protrusão), para baixo (fechamento) e para trás (retrusão). Esses quatro movimentos são importantes para o crescimento da face e para dar espaço na arcada dentária para o nascimento e alinhamento dos dentes;- o bebê faz apenas dois movimentos com o queixo: para baixo (abertura) e para cima (fechamento). Com apenas esses dois movimentos, o crescimento da face será direcionado para a vertical e o crescimento horizontal ficará prejudicado;
- o bebê faz pressão positiva, chamada de ordenha, ou seja, a mandíbula (queixo) massageia o peito e o leite é coletado pela língua.;- o bebê sempre faz pressão negativa (formam-se furinhos na bochecha) e isso faz com que haja uma alteração no crescimento da face, arcadas dentárias e consequente alinhamento dos dentes;
- o bebê exercita os músculos que serão responsáveis pela futura mastigação (masseteres, temporais e pterigoideos);- o bebê não exercita os músculos que serão responsáveis pela futura mastigação, mas exercita o músculo da bochecha (bucinador), que não deve ser tão exercitado e poderá provocar problemas no alinhamento dos dentes;
- os músculos da mastigação são exercitados e permitem com que o céu da boca se desenvolva corretamente, ou seja, que fique mais horizontal, favorece a respiração pelo nariz e o fechamento dos lábios;- o músculo da bochecha fará uma pressão sobre o céu da boca, que com o tempo se tornará mais alto. Esse formato mais alto dificultará a respiração pelo nariz e o fechamento dos lábios e favorece a respiração pela boca, que traz inúmeros prejuízos para a criança.

Com a leitura atenta do quadro acima, pode-se concluir que não existe compatibilidade entre o aleitamento materno e o uso da mamadeira, pois a forma de sucção é totalmente diferente.
Para evitar os problemas decorrentes dessa confusão de bicos (desmame, alterações motoras orais, alterações ortodônticas, desvios do crescimento ósseo facial, alterações de tonicidade, mobilidade e funções orais, com possibilidade de desenvolvimento de respiração oral, deglutição atípica, alterações de fala e mastigação, entre outras, as mães devem ser encorajadas, apoiadas e incentivadas a manter o aleitamento materno exclusivo até seis meses, iniciar a alimentação complementar aos 6 meses com mudanças graduais de consistências e dar continuidade ao aleitamento materno até 2 anos ou mais, não oferecer mamadeiras ou chupetas e, se houver necessidade de complementação, dar preferência à utilização do copo como método alternativo e temporário.
 Dra. Cristiane Gomes
Fonoaudióloga
CRFa 7771
 Especialista em Motricidade Orofacial (CFFa)
Mestre em Educação (UNESP – Marília)
Doutora em Pediatria (UNESP – Botucatu)
Pós-Doutorado em Saúde Coletiva (UEL – Londrina)
Docente do Centro Universitário de Maringá (CESUMAR)

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