sábado, 7 de janeiro de 2012

Entre Mães e Avós- por Claudia Rodrigues

Por Cláudia Rodrigues, jornalista, terapeuta reichiana, autora de Bebês de Mamães mais que Perfeitas, 2008. Centauro Editora. Blog:http://buenaleche-buenaleche.blogspot.com

Ainda que a oferta de berçários tenha praticamente excluído as avós como primeiras substitutas das mães, as avós, por seu compromisso atávico com os filhos dos filhos e filhas, costumam ser figuras importantes na vida dos netos, mesmo quando moram longe e não convivem diariamente com as crianças. Avós revivem com os netos o que viveram com os filhos muitos anos depois de terem perdido o contato filogenético com bebês, crianças pequenas e adolescentes. É a vida mostrando sua simplicidade nas repetições biológicas, não necessariamente comportamentais.
Avós às vezes repetem com os netos exatamente o que fizeram com os filhos, orgulham-se da educação que deram, em outras aproveitam para fazer reparações, vêem nos netos a oportunidade para ser mais benevolentes com as crianças.

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Quando os novos pais são repetidores da própria educação fazem exatamente como fizeram seus pais, o excesso de benevolência por parte dos avós é tolerado com uma certa facilidade. Se os avós são mais duros com os netos- é mais raro, mas pode acontecer- e os pais são repetidores, a tolerância dos pais ainda estará lá vestida de vista grossa.

Os maiores conflitos entre pais e filhos adultos em relação à educação das crianças surgem entre avós convictos da educação que deram e filhos convictos dos erros que viram na própria educação. Os reparadores querem fazer diferente e orgulham-se disso. 

Nem toda a avó que utilizou mamadeira vai boicotar a amamentação natural da filha, mas acontece, não é raro e os motivos são muitos, talvez o principal deles seja um desejo secreto de viver uma nova maternidade via filho da filha e a alimentação tem um poder profundo na relação, o bebê se apega em quem o alimenta, mesmo sem estudar sabemos, nascemos sabendo disso. “Será que esse bebê não está chorando porque está com fome!?” é uma pergunta-resposta que salta pela boca da via inconsciente da avó que quer de volta o seu lugar de mãe porque não está preparada para dar conta do seu corpo na fase em que está. Ela se vê avó sentindo-se mãe, uma mãe melhor do que a filha ou a nora.
Se a filha quiser e precisar que essa avó seja sua substituta imediata, ceder a um apelo desses e entregar o bebê é a atitude mais cômoda, mas quando a mãe deseja muito aleitar, não deseja repartir o vínculo via alimentação com ninguém, uma pergunta dessas pode causar um grande estrago na relação e vovozinhas aparentemente bem-intencionadas podem sair chorando pela porta dos fundos da casa da filha.
Assim como com a mamadeira, introduzir o hábito da chupeta é cada vez menos uma tendência das jovens mães fazer uso desse antigo consolador de bebês, já que são bem informadas sobre os prejuízos aos músculos faciais, à formação do palato e ao sucesso da amamentação.
Se a mãe não quer dar a chupeta porque sabe que não deve, mas se desespera diante do choro da criança e surge a avó com a chupeta comprada e fervida, impondo seu velho jeito em vez de ajudar à filha em seu propósito, lá se foi mais uma vovozinha pela janela de uma reparadora. Se a filha tiver tendência à repetição, engole a busca do ideal e em nome da paz familiar, assume que um dia pagará aparelho, buscará fonoaudiólogo ou, com sorte, estará fora das estatísticas mais prováveis.
Jovens mães andam por aí mais livremente com seus slings, abandonaram o carrinho ou usam muito pouco, valorizam a proximidade corpo a corpo com o bebê, reúnem-se semanalmente ou quinzenalmente com outras mães e profissionais da área, acham maternidade um assunto e tanto, descolam mil e um saberes sobre o desenvolvimento das crianças e utilizam grande parte do tempo que sobra da vida profissional para investir nas crianças, divertirem-se com as crianças. Todas essas novidades podem ser muito pesadas para as avós e deixá-las enciumadas, resmungando num canto que sabiam fazer melhor. Avós rabugentas criticam cada passo que a filha dá como mãe. Se o nariz da criança está escorrendo foi porque a mãe deixou pegar friagem, se a criança chora muito é porque foi mal acostumada e por aí vai.
 
Uma das coisas mais pesarosas do nosso andar pela vida quando envelhecemos é viver criticando as novas posturas, achando tudo o que os jovens fazem perigoso, ruim, inadequado. Ser uma filha crítica aos erros da mãe é quase uma necessidade, nós viemos para melhorar, mas ser uma avó crítica às tentativas de acerto da filha já é mais complicado.
Aos avós que cuidam ou apenas passam algumas horas com os netos cabe mil e uma mimosuras, os pais que desenvolvam a própria capacidade de tolerância, mas os pontos-chaves da educação, as diretrizes maternas e paternas, essas os avós deveriam respeitar com rigor a fim de poupar a família de dissonâncias maiores.
Para a criança o ideal é que a os avós reafirmem a postura dos pais como sendo boa. Ainda sobra muita alegria e coisas para se fazer sem haver necessidade de burlar as regras de base dos pais. É uma relação delicada, nunca fazer vista grossa para uma deslize de avós é sacanagem, mas vovós que fazem coisas escondidas e vivem falando que noras ou filhas são chatas, metidas a diferentes, cavam um distanciamento afetivo difícil de reparar.
Quando a avó compete com a mãe e a mãe se submete, acaba descontando na relação com a criança, é uma corda que rompe no lado mais fraco a cada geração. Por não conseguir enfrentar seu novo lugar no mundo, a mãe acaba sendo mais benevolente com a própria mãe do que com a filha. Como ela não fez com a filha o que desejava ou como desejava, acaba colhendo desagrados na relação e não vincula isso com a submissão à mãe. É um lugar muito apertado para a mãe acolher as necessidades físicas de um bebê e as maluquices psíquicas da própria mãe. Caberia à avó entender que aquela é uma experiência que ela já viveu, fez suas escolhas, é passado em sua vida, não deve ser mais um lugar de atuação, decisões, mas de acolhimento para o novo.
 
É por isso que toda noite antes de dormir, eu, que ainda estou quase longe de ser avó, digo a mim mesma: “se a nora ou a filha disserem para eu dar um danoninho e não uma bananinha como eu preferiria, vou dar um danoninho e pronto!”

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