Tudo aquilo que ninguém te contará sobre o processo.
Dia 25 de novembro é o Dia Internacional do Combate à Violência Contra a Mulher. É uma causa nobre, abraçada por milhares de pessoas, que se indignam cotidianamente com os relatos de humiliações e violências físicas e sexuais sofridas pelas mulheres de todas as classes sociais, no mundo todo. Mas, por algum motivo, quando se fala em violência contra a mulher, raramente menciona-se seu aspecto mais violento e predatório: a violência contra a mulher que está parindo, e contra seu filho que está nascendo.
Texto publicado no Blog Opus Daimon
A VIOLÊNCIA NA HORA DO PARTO
Você sabia que 1 em cada 4 mulheres relata ter sofrido algum tipo de abuso ou violência durante o seu parto? Você sabia que um dos maiores motivos da escolha pela cesária não é o medo da dor do parto, mas sim o medo de sofrer algum tipo de violência na hora do parto? Você sabia que a frase mais comum de se ouvir durante o parto é "ano que vem você tá aqui de novo" e a segunda mais comum é: "na hora de fazer, não reclamou, agora fica quieta!"?
Muitos arregalam os olhos diante dessas afirmações, sem saber que isso, na verdade, são os resultados de uma pesquisa recente, publicada em diversas revistas e jornais brasileiros, em fevereiro de 2011.
![](http://4.bp.blogspot.com/--QWFPAwz3M0/Tsy7f14aXoI/AAAAAAAACbw/C96GCjOXN_U/s320/Cesariana+%252811%2529.jpg)
Enquanto movimentos se organizam para resgatar e amparar mulheres que sofrem estupros, abusos e humiliações em suas casas e seu trabalho, as mulheres que parem em instituições públicas e privadas ainda estão completamente a mercê dos profissionais da saúde, e as violências que sofrem são, muitas vezes, consideradas como normais, "apenas rotina do hospital", e ficam por isso mesmo. Não é à toa que o parto é visto hoje como uma experiência terrível, da qual vale a pena escapar sempre que possível.
DE ONDE VEM ESSA VIOLÊNCIA
O obstetra humanizado Ricardo Jones, autor do livo Memórias do Homem de Vidro, afirma que o parto é um momento em que se confrontam as três esferas que mais amedrontam os seres humanos: o nascimento, a morte e a sexualidade. Ao confrontar-se com o desconhecido, aquilo que é incontrolável, que causa angústia, a tendência humana é criar ritos, para assim ter a ilusão de que a situação está sob controle.
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Parto ou exorcismo? |
COMO SE EXPRESSA ESSA VIOLÊNCIA
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"Quem faz o parto é o médico" |
Vejamos agora, mais em detalhes, algumas facetas dessa violência, tão discreta, porém tão cruel:
A POSIÇÃO DO PARTO
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Posição supina de parto |
A FALTA DE PRIVACIDADE E DESRESPEITO À SEXUALIDADE
Durante o trabalho de parto no hospital, a mulher perde qualquer direito à privacidade. É comum estarem presentes diversas pessoas da equipe de saúde, entrando e saindo do quarto o tempo todo. É uma realidade, infelizmente, a completa falta de respeito à privacidade da mulher, e o total não-reconhecimento da natureza sexual do fenômeno parto, dentro do ambiente hospitalar.
"o toque [vaginal] era feito por mais pessoas, tinha uma médica que estava fazendo, depois trocou o plantão, aí veio mais gente, acho que uns dez estavam lá [...] uns cinco mais ou menos fizeram o toque na mesma hora [...] fizeram, e depois passava um tempo, e aí vinham tudo ao redor de novo [...] incomoda um pouco, incomodou porque machuca a gente [...] mas tinha que fazer, eu achei que fosse normal também."
O toque vaginal é um aspecto mais sutil da questão, e é utilizado, geralmente, com 3 propósitos principais:
- Medir a dilatação do colo uterino: nesse caso, o toque é indolor pois serve apenas para avaliar a dilatação. O toque pode ser usado durante o trabalho de parto, porém não é necessário fazê-lo. Segundo a OMS e o Ministério da Saúde, o toque vaginal não deveria ser feito em excesso, e deveria ser feito apenas com o consentimento da mulher.
- Proceder a um descolamento manual das membranas amnióticas: trata-se de uma intervenção bastate usada nas últimas consultas do pré-natal, para induzir o parto. Não é recomendada pela OMS como procedimento a ser efetuado de rotina.
- Proceder a uma dilatação manual do colo do útero: é um procedimento violento, extremamente doloroso, que muitas vezes resulta em edema do colo do útero e indicação de cesariana. Não é recomendado que se faça nunca.
![](http://www.plannedparenthood.org/images/PPFA/080000-Bimanual-Pelvic-Exam.gif)
Partos traumáticos, marcados por esse tipo de violência, chegam a ter um impacto muito grande na dimensão sexual da mulher, e podem chegar ser tão traumatizantes quanto um estupro, trazendo consequências psicológicas muito similares.
AS INTERVENÇÕES DE ROTINA
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Monitoramento fetal contínuo |
![](http://1.bp.blogspot.com/-q3kaaoHQYt0/Tsy7nm2LmWI/AAAAAAAACb4/UbkP8OkkPOo/s320/medico1.jpg)
Não existem justificativas válidas para explicar porquê quase 100% das mulheres passam por este procedimento de forma rotineira nas maternidades, a menos que se entenda o parto como um rito de passagem, e um dos rituais adotados pelos médicos neste rito é amutilação da vagina, símbolo ocidental da maternidade (pois é, somos doidos mesmo!).
OS CUIDADOS COM O BEBÊ
![](http://1.bp.blogspot.com/-CYQJ4wiHFEA/Tsy71dS_GPI/AAAAAAAACcQ/buweQ22IPlA/s320/birth-head-out.jpeg)
Depois desse recebimento hostil, o bebê é colocado em um bercinho aquecido, onde fica "em observação", sozinho, gritando por sua mãe, durante algumas horas (às vezes mais de 8 horas). Somente depois de passar por tudo isso é que mãe e filho serão reunidos, e poderão então lamber suas feridas e começar uma nova vida juntos, tentando esquecer o evento traumático que acabam de vivenciar.
VERBOSE: QUANDO A PALAVRA È UM PROBLEMA
Verbose é a patologia da palavra ou, em outros termos, a iatrogenia causada pela palavra. A iatrogenia ocorre quando aquilo que deveria ser fonte de cuidado e cura vira fonte de mal-estar e patologia, ou seja, quando a intervenção acaba fazendo mais mal do que bem. Até aqui, vimos como o parto, no modelo hospitalar brasileiro dominante hoje, está saturado de iatrogenias, porém, a iatrogenia da palavra adquire, no contexto do parto, um sentido especial, e vale a pena ressaltá-lo.
O parto depende de um delicado equilíbrio hormonal para evoluir corretamente. O hormônio principal desse "coquetel de hormônios" do parto é a ocitocina endógena, um hormônio que é responsável também pela sensação de orgasmo, e depende de um determinado estado mental para ser liberado com eficácia. Este estado mental é de calma e descontração, relaxamento e tranquilidade. É um estado mental que propicia a entrega do corpo e é comparável ao estado mental da pessoa durante uma relação sexual. Biologicamente, o que acontece é um "desligamento" do neocórtex, a parte mais "racional" do cérebro, deixando a parte mais primitiva do cérebro em total controle do que está acontecendo: é um transe, e no parto, é chamado de Partolândia.
Assim como durante a relação sexual, qualquer palavra mal colocada durante o trabalho de parto pode "quebrar o clima" completamente, fazendo o processo "travar". Por isso é muito importante ficar atentos ao que se diz em presença de uma mulher em trabalho de parto.
Ana, chorei lendo esse texto. Me fez lembrar de tudo o que passei no parto da Samanta, e olha que fui super bem tratada no hospital porque meu marido trabalhava lá. Imagina se fosse uma reles desconhecida?! Mas TODOS as intervenções de rotina eu sofri, mesmo PAGANDO a obstetra para acompanhar meu parto ela não respeitou NADA do que eu pedi.
ResponderExcluirMeu medo é que vem outro aí e não vejo como fugir dos mesmos procedimentos.....
Calma Ale!! Já te disse, vamos achar uma Doula pra ti! Vai dar tudo certo! Faz um plano de parto!!!
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