domingo, 5 de junho de 2011

Mitos Obstétricos

Mitos Obstétricos desvendados por Déborah Allen



Muitas de minhas clientes me procuram tristes e indignadas depois de ter a experiência traumática do primeiro parto tratado agressivamente, e, ainda assim, com a esperança de que o que elas acreditam ser uma das experiências mais bonitas de suas vidas ainda seja possível na próxima gravidez. Sentiam-se não ouvidas, desrespeitadas, intimidadas, com uma mistura de confiança abalada e determinação crescente.

Obstetras são cirurgiões treinados; eles querem FAZER algo mais do que esperar ou que a mãe o faça. Eles não estão dispostos a ver mulheres como especialistas em gravidez nem têm tempo ou paciência para sentar ao seu lado enquanto seu trabalho de parto progride. A maioria nunca viu um parto natural. Apesar da intenção de fazer o bem pelos seus pacientes, eles acreditam que o processo natural de gestação e parto são intrinsecamente problemáticos e intervenções irão ajudar. Para muito obstetras, um bebê e uma mãe vivos definem um resultado positivo. 

Os seguintes mitos e o que sabemos que é realmente verdade devem ajudá-lo a separar crenças de fatos, práticas ultrapassadas do que é necessário. 

  • Mito: Um bebê grande que não consegue se encaixar na pelve da mãe, só irá aumentar de tamanho quanto mais a gestação dura, e é uma razão válida para induzir o parto.
O que sabemos: Primeiro, o parto não é uma questão de física, é um processo no contexto de uma relação. A pelve da mulher é uma estrutura flexível que se estende para permitir a passagem do bebê. Esse processo é auxiliado pelos movimentos maternos durante o trabalho de parto e durante a fase de expulsão. Os hormônios do final da gestação amolecem o tecido conjuntivo que segura osso com osso, aumentando assim a elasticidade da pelve. A desproporção céfalo-pélvica verdadeira é extremamente rara. O termo é muitas vezes usado como desculpa para a impaciência ou a explicação de nenhum progresso quando a mãe é medicada em suas costas para dar a luz. Não é justo dizer a uma mulher que sua pelve é inadequada para dar a luz a seu filho baseando-se em exames de raios-X ou ultra-som. As estimativas de peso de um feto em um exame de ultra-som podem errar meio-quilo para mais ou para menos. A cabeça do bebê é desenhada para ser moldada, os ossos se sobrepõem e se alongam para acomodar-se à pelve da mãe. Eu vi bebês muito grandes saírem de mães muito pequenas! Uma de minhas clientes que pesava 42.3 kg quando concebeu e 60.5 kg ao final, deu a luz a um menino de 4.3 kg em poucas horas; Outra mãe sadia de primeira viagem deu a luz a um bebê de quase 5.4 kg, para nosso espanto. Um bebê grande não é uma razão válida para induzir o parto. 

  • Mito: Durante a gestação, a mulher deve limitar seu aumento de peso a 11.4 kg. Isso permitirá um parto mais fácil; previne a toxemia; na verdade, não importa o que você come durante a gravidez porque o bebê tomará o que precisa de seu corpo; e, o aumento de peso é mais determinado pela hereditariedade.
O que sabemos: É verdade que restringir o aumento de peso na gravidez resulta em bebês menores. No entanto, a idéia de que um bebê menor facilita o parto não correlaciona a privação nutricional às dietas de muito baixas calorias. Com uma nutrição inadequada durante a gestação, a mãe pode não ter resistência e força para o parto. Toxemia é uma das complicações mais perigosas durante a gravidez. Hoje em dia se sabe que a causa é metabólica, ou seja, a falta de nutrientes essenciais na gestação, principalmente, de proteínas. A falta desses nutrientes resulta em um mau funcionamento do fígado. Nos dois últimos meses de gestação, o bebê tem um surto de crescimento. Esse é o momento em que a mulher reduz o consumo de comida e do sal para ficar dentro do limite de peso receitado pelo médico. Essa fase crítica do desenvolvimento do bebê, especialmente do seu cérebro, pode ser seriamente comprometida pela nutrição e ingestão de calorias inadequadas pela mãe. A falta de 1/3 das calorias necessárias resulta em metade das proteínas dietéticas dela queimadas como combustível! Isso deixa a mãe e o seu bebê mal nutridos, sendo que o bebê desenvolve uma condição de alto risco, Mães e bebês mais saudáveis é resultado do foco na nutrição e não no aumento do peso ou sua restrição. 

  • Mito: Assim que as membranas que constituem o saco amniótico (que envolve o bebê e o líquido amniótico no útero) são rompidas, o bebê precisa nascer dentro de 24 horas para evitar infecção.
O que sabemos: É comum que a bolsa de uma mulher rompa horas antes de começarem as contrações. A espera de 24 horas depois da ruptura espontânea das membranas e antes de ser induzido com medicamentos, permite que a maioria das mulheres inicie o parto por conta própria. A espera de mais 48 horas permite que cerca de 95% das mulheres iniciem o parto espontaneamente Durante esse período os exames vaginais NÃO podem ser feitos. Exames vaginais podem iniciar infecções trazendo bactérias para o colo do útero através do exame com luvas. Nem mesmo monitores internos do feto deveriam ser instalados. Assim como nada deve ser colocado na vagina, inclusive nem fazer sexo. A vagina é bastante hermética e fluídos e secreções saem e não entram. Esse prazo limite de 24 horas foi aconselhado pela primeira vez na década de 1960, e é uma das principais razões para a indução de partos ou Cesariana, se a indução não funcionar. Em 1996, um estudo com 5000 mulheres não encontrou nenhum aumento da infecção de bebês até quatro dias após a ruptura das membranas antes do início do trabalho de parto. (Mary E. Hannah et al., “Induction of Labor Compared with Expectant Management for Prelabor Rupture of the Membranes at Term: Term PROM Study Group,” New England Journal of Medicine 334, no 16 (1996): 1005-10.) 

  • Mito: Indução de partos em datas posteriores às previstas melhora os resultados perinatais.
O que sabemos: Datas de parto determinadas pelo ultra-som são precisas, mas com margem de erro de uma a duas semanas, na melhor das hipóteses, sendo que uma fonte sugere que é de 5 a 22 dias. Mesmo assim, a obstetrícia moderna dá mais crédito às datas previstas pelo ultra-som do que ao conhecimento da mãe de sua própria fertilidade (ela pode ter longos ciclos) e quando ela diz que a concepção deve ter ocorrido. A indução do colo do útero imaturo leva a um trabalho de parto mais demorado e mais difícil. Se a mãe não está pronta, seu corpo não responderá à indução. As induções que não dão certo levam aos números assustadores de cesarianas e a todos os riscos que incorrem. Outras conseqüências da indução precoce incluem um elevado número de bebês prematuros, bebês com problemas respiratórios e aqueles que precisam permanecer mais tempo sob cuidados médicos, A data do parto é apenas uma “data prevista”. Algumas semanas tanto antes quanto depois desta data prevista é perfeitamente normal para um bebê nascer. Eu li que a placenta continua a formar novos vasos sanguíneos durante toda a gravidez. Talvez haja outros fatores que afetam a duração da gestação, como o clima, quantidade de luz (por exemplo, latitudes Norte vs o Equador), saúde, estresse e diferenças individuais entre as necessidades tanto do bebê quanto da mãe. Uma mãe atenciosa recentemente disse, “Eu acho que, quando eu estava doente durante a gestação, meu bebê estava no botão ‘pause’!” Basta dizer que nós não temos nem idéia de quais preparativos são necessários antes do bebê fazer a sua grande estréia no mundo. Eu acredito que é injusto apressá-los e privá-los do seu tempo devido no útero. Bebês nascem quando estão prontos. 

  • Mito: Uma mulher em trabalho de parto não deveria comer nem beber porque, caso precise de anestesia geral, ela pode vomitar e inalar o conteúdo do seu estômago enquanto estiver inconsciente, arriscando contrair pneumonia por aspiração.
O que sabemos: Se uma mãe em trabalho de parto está com fome ou com sede, ela deve comer ou beber. Na década de 1940 “Nada pela boca” tornou-se prática padrão quando anestesistas não eram altamente treinados e experientes como eles são hoje em dia. A aspiração do conteúdo do estômago é quase desconhecida agora visto que a intubação (introduzir um tubo na traquéia abaixo da garganta) é rotina durante a anestesia geral, e a anestesia de parto, na maior parte, é em forma de peridural durante a qual as mulheres estão conscientes. Não comer antes de ir para o hospital não garante um estômago vazio, já que o trabalho de parto diminui a digestão da alimentação ingerida horas antes. Sucos gástricos são sempre secretados mesmo se o estômago estiver vazio. Uma mulher em trabalho de parto é uma atleta, e assim como um atleta ela precisa de água e nutrientes antes e/ou durante seu grande evento se ela o desejar. Fome no trabalho de parto causa Cetose, uma condição metabólica de degradação incompleta de gorduras para ser usadas como combustível porque a glicose do sangue está indisponível. Além disso, a fome no parto pode fazer com que o útero se torne fatigado e funcione de forma desordenada (disfunção uterina).

  • Mito: Fluídos administrados por via intravenosa (IV) efetivamente substituem a comida e a bebida durante o parto.
O que sabemos: administração IV atrapalha o equilíbrio do fluídos normais e eletrólitos. Eles diminuem o sódio e a glicose no sangue. Se os fluídos são administrados por VI rápido demais para os rins da mãe os processarem, ela pode sofrer uma sobrecarga de fluídos: seu tecido pulmonar pode encher com o líquido assim como o seu cérebro. Eles não satisfazem a fome. Eles diluem a concentração dos hormônios do próprio corpo. O aparelho de administração IV não deixa caminhar durante o trabalho de parto, agachar, tomar banho e se mover em geral. A glicose na administração VI pode causar a elevação muito alta do nível de glicose. Além disso, pode acrescentar o peso da água ao peso do bebê que, quando excretado, pode parecer que o bebê perdeu muito peso nos primeiros dias após o parto. Também causa a formação de lactato levando a um pH mais baixo na mãe e no bebê, e com o pCO2 elevado causa acidose fetal, ou seja, um distúrbio. Algo tão rotineiro como a administração IV pode ter tantas conseqüências! 

  • Mito: As vantagens da anestesia peridural são tão convincentes e os riscos tão insignificantes que é justificável oferecer e administrá-la sistematicamente a cada mãe em trabalho de parto (ter um parto em hospital).
O que sabemos: Peridural pode ser um alívio profundo e ajudar principalmente nos partos prolongados ou difíceis ou nas cesarianas. A anestesia se tornou a norma em mais de 80% dos partos nos Estados Unidos. Mas assim como outras intervenções obstétricas, ela apresenta graves riscos os quais são raramente discutidos ou compreendidos. Alguns são listados aqui: Peridural geralmente diminui a pressão arterial (portanto, a administração IV deve ser iniciada para administrar um outro medicamento se necessário), eles elevam a temperatura do corpo da mãe, o que afeta o bebê; tipicamente, peridural aumenta a duração do parto por isso a ocitocina sintética deve ser administrada; peridural bloqueia a secreção de adrenalina; bloqueia endorfinas, as quais estimulam a liberação de prolactina que é importantíssimo para a amamentação; peridural diminui a produção de prostaglandina, o hormônio do parto que mantém a resposta uterina; peridural pode aumentar ou diminuir os batimentos cardíacos do bebê; peridural pode causar dores de cabeça que duram por dias; peridural pode causar a intoxicação do bebê por medicamentos antes e depois do parto – os níveis dos medicamentos podem ser mais altos no bebê do que na mãe, o que pode levar às alterações neurocomportamentais no recém nascido, assim como à icterícia. Ainda que raras, as conseqüências também podem ser convulsões, paralisia respiratória, parada cardíaca, choque anafilático e lesão de nervos. O uso de peridural leva a pensar que a dor do parto natural é inútil, deve ser evitada e que as mulheres não conseguem lidar com ela de forma criativa em benefício delas e dos seus bebês. 

  • Mito: Se o mecônio (cocô do bebê) estiver presente no líquido amniótico antes do parto, o bebê precisa ser incubado e aspirado o mais rápido possível. Isso é para evitar a aspiração de mecônio, o qual pode provocar infecção aos pulmões.
O que sabemos: Mecônio no líquido amniótico acontece em talvez 25% dos partos, mas nós preferimos ver águas cristalinas. Acredita-se que o esfíncter anal do bebê em algum momento seja privado de oxigênio o suficiente para não poder permanecer apertado, liberando um pouco do mecônio. A suposição é algum tipo de sofrimento fetal. Do ponto de vista de uma parteira, é importante determinar se o mecônio foi liberado recentemente ou alguns dias depois, e até que ponto. Geralmente, bebês mantêm suas bocas fechadas e não tendem a inspirar durante o trabalho de parto. Suas caixas torácicas são contraídas no processo de nascimento sem alterações de pressão para estimular a expansão dos pulmões até o nascimento. Se o mecônio aparecia antes do nascimento, era uma prática comum aspirar as vias respiratórias do bebê, quando a cabeça estava fora e antes do corpo sair, esperando ser mais rápido com a sucção do que o bebê para respirar. Logo após o nascimento, o cordão do bebê era rapidamente grampeado e cortado, o bebê levado para a mesa de aquecimento e a intubação e sucção prosseguiam. Os rrofissionais sabem agora que a intubação pode forçar o líquido contaminado com mecônio pela traquéia, o que aumenta a probabilidade de aspiração, (para não mencionar a lesão no tecido frágil da garganta.) Felizmente, esse tipo de prática está mudando. No caso de mecônio espesso, o bebê pode precisar de ajuda para limpar as vias respiratórias. Geralmente, os bebês são perfeitamente capazes de limpar os fluídos de seus sistemas respiratórios como parte natural de sua primeira respiração. 

  • Mito: Um bebê em posição pélvica deve nascer de cesariana.
O que sabemos: A posição pélvica é uma variação da posição normal, onde a cabeça está no alto do útero da mãe e as nádegas e/ou um pé ou pés se aparecem primeiro no nascimento. No entanto, o mito também é uma realidade porque a obstetrícia moderna perdeu o conhecimento e interesse em ajudar em partos de bebês na posição pélvica. As técnicas para esse tipo de parto são compartilhadas entre muitas de nós, parteiras. Nos partos de bebês virados mais do que nos partos na posição vertex (cabeça primeiro), as características da mãe e a afinidade com o parto são de extrema importância. Como as mães são atendidas durante a gestação e a abordagem de seus médicos tem tudo a ver com o seu nível de confiança em si mesmas para dar a luz a seus bebês. A Universidade Americana de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) admite que a Cesariana para partos de bebês em posição pélvica “será o modo preferido de parto”, por causa de pouca experiência nesse tipo de partos e não porque o parto natural é extremamente perigoso. 

  • Mito: Uma episiotomia (cortar a vagina para alargar a abertura) irá evitar um rasgo pior e é mais fácil de sarar
O que sabemos: A episiotomia em si é um dano ao nascimento e quase nunca é necessário. Uma episiotomia piora o rasgo, pois inicia danos à integridade do períneo, o que, então, pode continuar ao longo da linha de incisão. O períneo da mulher pode nem rasgar durante o parto ou pode ter um rasgo pequeno. Com raras exceções, um rasgo, por pior que seja, não será pior do que uma episiotomia. Então, para que cortar? Não há evidências científicas que apóiem a episiotomia. De fato, a Universidade Americana de Obstetras e Ginecologistas em 2006 foi contra o uso da episiotomia, indicando que o seu uso rotineiro é prejudicial por causa de infecções crescentes, incontinência urinária e fecal, dor prolongada e problemas sexuais. 

  • Mito: Uma vez Cesariana, sempre Cesariana.
O que sabemos: O termo VBAC em português significa Parto Vaginal depois de Cesariana. Ainda nas décadas de 80 e 90, as mulheres eram encorajadas por obstetras a terem os partos naturais depois de uma cesariana, com uma taxa de 75% de sucesso. O pequeno risco de ruptura uterina ao longo da primeira cicatriz da cesárea de 0.5% foi reconhecido como o menor risco associado com a repetição da cesárea. (A ruptura uterina pode acontecer com ou sem a cesárea anterior, assim como ser uma pequena deiscência ou separação do tecido, o que não é ameaça para a vida do bebê ou da mãe.) Em 1996, a VBCA, recebeu críticas negativas da mídia quando publicou um estudo em que as mulheres com cesarianas não programadas sofriam duas vezes mais lesões cirúrgicas e perda de sangue do que as mulheres com cesarianas planejadas. Argumentou-se que as mulheres deveriam, portanto, planejar suas cesarianas em vez que arriscar-se com uma não planejada. Assim como a maioria das parteiras, eu já fui a parteira de muitas mulheres que tiveram partos vaginais depois de cesarianas. Nós sabemos que há obstáculos a serem superados. Nós certamente sabemos “Uma vez Cesariana, sempre Cesariana” não é a realidade. 

Está na hora de nós, mulheres, reconquistarmos nosso território exclusivamente feminino e dar a luz aos nossos bebês de acordo com as nossas próprias escolhas e incríveis habilidades.

 *Fonte: Blog da Gisele

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