Texto maravilhoso!!
Por Douglas N. Gomes*
O trabalho do pediatra está completamente inserido no momento do bem
nascer. Seu papel é importante para garantir a preservação do que a natureza
reserva para mães e bebês no nascimento. Cabe a esse profissional evitar as
interferências causadas por procedimentos desnecessários ou inoportunos no
nascimento.
Entre as suas atribuições primordiais está a de garantir um contato
íntimo, pele a pele, da mãe com o bebê após o nascimento. Além satisfazer a
vontade da maioria das mães de ver e tocar seu bebê logo após o parto, esse
contato também é a melhor forma de proporcionar o equilíbrio da temperatura e
dos sinais vitais do bebê, fato que já foi provado por pesquisas científicas
desde 1995.
Hoje sabe-se que quando é garantido um ambiente aquecido e com pouca luz
quase todo recém-nascido olha demoradamente os olhos de sua mãe, muitas vezes
não chora e se adapta com mais tranquilidade ao novo ambiente menos quente,
mais barulhento e com maior força de gravidade do que o uterino.
Está cientificamente comprovado que os bebês que mamam na primeira hora
de vida têm maior possibilidade de estender seu período de amamentação
exclusiva, chegando com mais facilidade ao ideal recomendado pela Organização
Mundial da Saúde de alimentar os bebês exclusivamente ao seio até os seis meses
de vida e manter a amamentação, junto com alimentos complementares, até dois
anos ou mais.
A essência da assistência humanizada ao parto e ao recém-nascido está em
atender da melhor forma possível as necessidades de saúde das famílias nesse
momento tão especial da vida. E, ao mesmo tempo, não ceder ao interesse do
sistema médico de oferecer recursos tecnológicos muitas vezes desnecessários ou
inoportunos para a investigação de doenças e problemas de saúde. Na base da
filosofia humanizada está o entendimento da saúde como o bem estar e a
felicidade das pessoas. Não apenas como a ausência de doenças.
Se por um lado é certo que evitar, identificar e tratar doenças ou
problemas do corpo, da mente e da vida social das famílias fazem parte do papel
do médico pediatra, por outro ainda são poucos os profissionais que conseguem
identificar as reais necessidades de saúde das famílias durante o parto, o
nascimento e a infância.
Para isso, o pediatra precisa ter uma escuta qualificada para questões
não médicas e por vezes muito determinantes da saúde dos bebês e das crianças
como a história de vida do casal e de suas famílias, as qualificações
individuais dos pais para lidar com mudanças ou com situações diversas da vida,
a resiliência de cada um, o entendimento que as famílias têm do processo de
nascimento e parto, o entendimento individual do processo saúde-doença, a rede
de apoio familiar do casal e até os conflitos na relação do casal, que não raro
se refletem em problemas para a criança, como por exemplo na dificuldade de
amamentação.
Faz parte do atendimento humanizado ao recém-nascido não realizar
movimentos intempestivos, que causam choro ou desconforto, em suas primeiras
horas de vida. O bebê deve ser manuseado com suavidade e leveza. Algumas ações
que refletem essa manipulação delicada e suave são:
• movimentar lenta e delicadamente o bebê após sua saída do canal de
parto para conduzi-lo ao colo da mãe;
• enxugar delicadamente com panos preaquecidos a parte de trás do corpo
do bebê, que não está em contato direto com a pele da mãe;
• enxugar apenas tocando, sem esfregar a pele do bebê;
• trocar os panos preaquecidos que envolvem o bebê, a qualquer momento,
se ficarem úmidos ou encharcados de líquido;
• dar atenção especial ao rosto do bebê, limpando suavemente eventuais
resíduos de líquido ou sangue;
• encontrar uma posição mais confortável para o bebê sobre o ventre ou o
peito da mãe caso ele chore ou mostre algum desconforto;
• não deixar em nenhum momento o bebê desenrolado ou com partes do corpo
descobertas ou expostas ao frio;
• se o bebê nascer na água, aquecê-lo com a própria água morna da
banheira, derramando-a suavemente sobre as costas dele;
• aguardar o bebê dar sinais de que quer mamar para posicioná-lo próximo
à aréola do seio materno, dando a ele a oportunidade de se movimentar para
buscar e abocanhar o peito;
• não interromper o contato pele a pele do bebê com a mãe por motivos
banais como a necessidade de mudança de posição da mulher para os procedimentos
finais do parto;
• realizar os procedimentos de rotina, como pesar e medir o bebê, apenas
depois que ele terminar de mamar ou após o final da primeira hora de vida, se
não tiver mamado;
• pesar o bebê enrolado em panos preaquecidos para não expô-lo ao frio;
• fazer o primeiro exame pediátrico com o bebê em ambiente aquecido, com
enrolamento parcial, em posição organizada (com os membros agrupados) e com
contenção facilitada pelo pai ou familiar;
• dar o primeiro banho do bebê no quarto, enrolado em panos e em posição
vertical (dentro do balde) para que ele relaxe e até durma, se quiser;
• oferecer ao casal a possibilidade segura de aplicar vacinas e realizar
procedimentos dolorosos no bebê somente após estar acertada a amamentação;
• ouvir os pais e explicar detalhadamente todos os procedimentos e
exames necessários para o bebê e sugerir soluções práticas para sua realização;
• dar suporte e resolver todos os problemas relacionados ao manejo da
amamentação exclusiva;
• fazer visitas médicas complementares (hospitalares ou em casa, no caso
de parto domiciliar), se necessário, para garantir os cuidados adequados e
individualizados para cada bebê, de acordo com suas necessidades e os problemas
diagnosticados.
Alguns diferenciais do pediatra humanizado:
• disponibilidade para estar presente no momento do parto;
• abertura para ouvir e acolher os questionamentos dos pais com relação
à própria conduta, aos procedimentos do hospital ou da equipe;
• assertividade para proteger o bebê de rotinas hospitalares
desnecessárias que impeçam um nascimento natural e impossibilitem a amamentação
precoce;
• disponibilidade para atender chamados durante o período pós-parto;
• acolher as demandas e vontades do casal quanto a todos os cuidados e
procedimentos que serão dispensados ao bebê durante sua estada no hospital;
• oferecer alternativas domiciliares de tratamento após a alta para
problemas como dificuldades na amamentação, banho de luz para tratamento de
icterícia, além de consultas em casa para pais que assim desejarem nas
primeiras semanas de vida;
• disponibilidade para responder a todas as ligações dos pais, sem
demora, seja de bebês com poucos dias vida ou de crianças maiores;
• utilizar os diversos meios de comunicação disponíveis como e-mail, programas
de troca de mensagens instantâneas e torpedos para agilizar a comunicação com
os pais;
• disponibilidade para conversar com pediatras de prontos-socorros onde
seus pacientes porventura estejam sendo atendidos em casos de urgência para
avaliar em conjunto as condutas médicas que estão sendo tomadas;
• disponibilidade para visitar, quantas vezes necessário, os bebês que
precisarem de internação com o objetivo de acompanhar as condutas propostas e
sugerir mudanças, além de esclarecer as dúvidas da família e dar suporte
emocional aos pais.
- – - – - – - – - – -
* O autor é médico pediatra e faz parte da equipe de profissionais da
Casa Moara.
Nenhum comentário:
Postar um comentário